Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar – sozinho, à noite –
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
A
“Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias, texto-matriz, foi produzida no
primeiro momento do Romantismo Brasileiro, época na qual se vivia uma
forte onda de nacionalismo, que se devia ao recente rompimento do
Brasil-colônia com Portugal. O poeta trata,neste sentido, de demonstrar
aversão aos valores portugueses e ressaltar os valores naturais do
Brasil.
Quando
Gonçalves Dias escreveu este poema, cursava a Faculdade de Direito em
Coimbra, em julho de 1843. Vivia, dessa forma, um exílio físico e
geográfico. Tradicionalmente, esta é a situação do exílio.
CANÇÃO DO EXÍLIO (Murilo Mendes, 1930)
Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a
[ Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.
Ai quem me dera chupar uma carambola de
[ verdade
e ouvir um sabiá com certidão de idade!
O
poema de Murilo Mendes é uma produção do período Modernista, surgido a
partir da década de 1920 no país. Essa época se caracterizava pelo
nacionalismo crítico e por uma revisão tanto da história do Brasil como
da produção literária anterior que, segundo o pensamento da época, havia
uma apropriação inadequada das produções e ideais estrangeiros.
Murilo
Mendes, em sua “Canção do Exílio”, denuncia a invasão cultural
estrangeira no Brasil. O nacionalismo em seu poema se fundamenta numa
crítica à realidade sociocultural brasileira. Ele não se conforma em se
aceitar tudo o que vêm de fora: as frutas, os pássaros, os artistas, as
ideologias… Ele tem consciência de que também temos coisas boas e que
temos de valorizá-las. Ele mostra, porém, que quando isso acontece, o
preço das coisas sobem: temos de comprar frutas de “quinta categoria”,
que são baratas, pois as nossas frutas, que são às melhores, são
exportadas e, quando comercializadas aqui, custam “o olho da cara”. Essa
desigualdade sócio-cultural faz o poeta sentir-se um exilado em sua
própria terra.
UMA CANÇÃO (Mario Quintana, 1962)
Minha terra não tem palmeiras...
E em vez de um mero sabiá,
Cantam aves invisíveis
Nas palmeiras que não há.
Minha terra tem relógios,
Cada qual com sua hora
Nos mais diversos instantes...
Mas onde o instante de agora?
Mas onde a palavra "onde"?
Terra ingrata, ingrato filho,
Sob os céus da minha terra
Eu canto a Canção do Exílio!
Mário
Quintana, poeta modernista, em sua releitura “Uma Canção”, não
apresenta um exílio geográfico, mas de uma inadaptação da realidade que o
envolve: o onde e o agora. É através desse questionamento da existência
que o poeta nega dois valores fundamentais do texto-mãe: “as palmeiras e
o sabiá”, quando afirma que “As aves invisíveis cantam em palmeiras que
não há”. Ele se sente como Murilo Mendes, um exilado em sua própria
terra.
Referências:
AMARAL, Emília et al. Novas palavras: língua portuguesa: ensino médio: 2ª série. 2.ed.renov. São Paulo: FTD, 2005.
SANTOS, Paula Perin dos. Canção do exílio. Disponível em Infoescola.
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